Li hoje no Facebook uma referência de um amigo nesta rede social, a este assunto, que me relembrou o que se passou comigo faz cerca de 3 anos.
Aqui fica, como memória a resposta que dei à carta da Sra. secretária de estado da altura.
Resta apenas acrescentar que as medalhas duplicadas foram levantadas na minha morada por um sr. sargento que as encaminhou ao seu destino.
"Ex.ma
Senhora Dr.ª Catarina Sarmento e Castro
No final do ano passado, nos
últimos dias de Dezembro de 2021, recebi uma carta em duplicado de
V. Ex.ª que acompanhava 2 estojos contendo a “Insígnia de Antigo
Combatente”.
Fiquei surpreendido com a
duplicação mas mais ainda com o conteúdo da carta de V. Ex.ª,
tendo em conta que o 25 de Abril de 1974, conforme
o entendo, foi realizado para depor o
regime colonial-fascista responsável por milhares de vítimas:
Mortos, estropiados, deficientes e outros que regressaram às suas
famílias traumatizados para toda a vida.
Acontece que o texto refere a
“abnegação, coragem, lealdade e
camaradagem” como valores em
abstracto sem ter em linha de conta a realidade que foi, numa imensa
maioria, ter sido forçada a partir para a guerra colonial.
No que me diz respeito,
alistei-me na Força Aérea Portuguesa como voluntário aos 18 anos
de idade precisamente para evitar ir mais tarde servir “de carne
para canhão” no exército e aí ser forçado a “combater” por
uma causa com que nunca me identifiquei.
Acrescento
ainda que, com 20 anos, no dia da minha partida para a guerra
colonial em Angola, o último evento que vivi foi o funeral do meu
pai que faleceu na véspera, não por coincidência mas por acidente
vascular.
Assim sendo, não me reconheço
como “combatente” duma causa colonial-fascista mas sim
como vítima de um regime que julgava há muito condenado e que por
isso esses valores “patrióticos” estivessem
abolidos da nossa sociedade.
Por este motivo considero um
equívoco pessoal ter pedido tal insígnia cujos valores associados
não correspondem ao meu pensamento social e político.
Há dias fui surpreendido,
outra vez, com a recepção de uma carta da empresa privada CTT que
me revelava: “...uma anomalia
pontual, verificada na produção/distribuição efectuada pelos CTT
– Correios de Portugal”, foi enviada a V. Ex.ª correspondência
em duplicado, contendo carta e insígnia de Antigo Combatente,
remetidos pela Secretaria-Geral do Ministério da Defesa”.
Esta referida carta
solicitava que eu devolvesse o duplicado “...de
correspondência à Secretaria- Geral do Ministério da Defesa numa
loja/Posto CTT ou ainda junto do distribuidor CTT”.
A
estranheza de tal procedimento levou-me a ter ainda
mais convicções sobre este assunto dos
“antigos combatentes” e de classificar, no mínimo, de ligeira a
forma como este problema social é encarado pelas autoridades
estatais. Nunca esperei ser ressarcido dos prejuízos de saúde,
reforma, etc pela minha condição de vítima da guerra colonial.
Infelizmente o regime saído do 25 de Abril de 1974 não esteve à
altura de julgar e punir os crimes do colonial-fascismo e
muito menos de, uma forma digna tratar e
apoiar os milhares de jovens (na altura)
que regressaram (os que conseguiram regressar) às suas terras
assistindo hoje
a manifestações de hipocrisia da parte de um Estado que vive de
promessas e salamaleques.
Tenho verificado que o
“cartão de antigo combatente” não me
trouxe qualquer regalia, até hoje: Quanto
à isenção das taxas moderadoras, eu já as tinha visto que sou
doente oncológico; À beira de completar 74 anos, em época de
pandemia, não utilizo transportes públicos, sendo que para minha
comodidade e defesa me desloco no meu automóvel particular fruto do
meu trabalho, não utilizando assim o passe gratuito pela condição
de “antigo combatente”; Morando eu em Queluz, se quiser passear
nos jardins do palácio nacional não tendo direito a gratuitidade,
nem aqui nem em todos os monumentos nacionais do meu concelho
(Sintra) porque estes estão concessionados a uma empresa privada;
Apenas recebo 150€ por ano de complemento especial de reforma que
me escuso de comentar, pela mesma condição de antigo combatente mas
anterior ao agora muito divulgado “cartão de antigo combatente”.
Por
tudo o que acabo de expor informo que estou à disposição da
Secretaria de Estado de Recursos Humanos e Antigos Combatentes para
devolver as insígnias em meu poder, não abdicando das presentes e
futuras regalias e apoios que venham a ser conferidos aos
ditos “antigos combatentes” a título
compensatório pela sua condição de vítimas da guerra
colonial-fascista portuguesa.
Quanto à forma de devolver as
insígnias poderá ser a que for julgada mais conveniente exceptuando
a entrega a uma empresa privada, neste caso os CTT.
Com os meus cumprimentos
Jaime dos Santos Pereira"