24 de agosto de 2025

A propósito da "insígnia dos antigos combatentes" (2022)

 Li hoje no Facebook uma referência de um amigo nesta rede social, a este assunto, que me relembrou o que se passou comigo faz cerca de 3 anos.
Aqui fica, como memória a resposta que dei à carta da Sra. secretária de estado da altura.
Resta apenas acrescentar que as medalhas duplicadas foram levantadas na minha morada por um sr. sargento que as encaminhou ao seu destino.

"Ex.ma Senhora Dr.ª Catarina Sarmento e Castro


No final do ano passado, nos últimos dias de Dezembro de 2021, recebi uma carta em duplicado de V. Ex.ª que acompanhava 2 estojos contendo a “Insígnia de Antigo Combatente”.

Fiquei surpreendido com a duplicação mas mais ainda com o conteúdo da carta de V. Ex.ª, tendo em conta que o 25 de Abril de 1974, conforme o entendo, foi realizado para depor o regime colonial-fascista responsável por milhares de vítimas: Mortos, estropiados, deficientes e outros que regressaram às suas famílias traumatizados para toda a vida.

Acontece que o texto refere a “abnegação, coragem, lealdade e camaradagem” como valores em abstracto sem ter em linha de conta a realidade que foi, numa imensa maioria, ter sido forçada a partir para a guerra colonial.

No que me diz respeito, alistei-me na Força Aérea Portuguesa como voluntário aos 18 anos de idade precisamente para evitar ir mais tarde servir “de carne para canhão” no exército e aí ser forçado a “combater” por uma causa com que nunca me identifiquei.
Acrescento ainda que, com 20 anos, no dia da minha partida para a guerra colonial em Angola, o último evento que vivi foi o funeral do meu pai que faleceu na véspera, não por coincidência mas por acidente vascular.

Assim sendo, não me reconheço como “combatente” duma causa colonial-fascista mas sim como vítima de um regime que julgava há muito condenado e que por isso esses valores “patrióticos” estivessem abolidos da nossa sociedade.

Por este motivo considero um equívoco pessoal ter pedido tal insígnia cujos valores associados não correspondem ao meu pensamento social e político.

Há dias fui surpreendido, outra vez, com a recepção de uma carta da empresa privada CTT que me revelava: “...uma anomalia pontual, verificada na produção/distribuição efectuada pelos CTT – Correios de Portugal”, foi enviada a V. Ex.ª correspondência em duplicado, contendo carta e insígnia de Antigo Combatente, remetidos pela Secretaria-Geral do Ministério da Defesa”.

Esta referida carta solicitava que eu devolvesse o duplicado “...de correspondência à Secretaria- Geral do Ministério da Defesa numa loja/Posto CTT ou ainda junto do distribuidor CTT”.

A estranheza de tal procedimento levou-me a ter ainda mais convicções sobre este assunto dos “antigos combatentes” e de classificar, no mínimo, de ligeira a forma como este problema social é encarado pelas autoridades estatais. Nunca esperei ser ressarcido dos prejuízos de saúde, reforma, etc pela minha condição de vítima da guerra colonial. Infelizmente o regime saído do 25 de Abril de 1974 não esteve à altura de julgar e punir os crimes do colonial-fascismo e muito menos de, uma forma digna tratar e apoiar os milhares de jovens (na altura) que regressaram (os que conseguiram regressar) às suas terras assistindo hoje a manifestações de hipocrisia da parte de um Estado que vive de promessas e salamaleques.

Tenho verificado que o “cartão de antigo combatente” não me trouxe qualquer regalia, até hoje: Quanto à isenção das taxas moderadoras, eu já as tinha visto que sou doente oncológico; À beira de completar 74 anos, em época de pandemia, não utilizo transportes públicos, sendo que para minha comodidade e defesa me desloco no meu automóvel particular fruto do meu trabalho, não utilizando assim o passe gratuito pela condição de “antigo combatente”; Morando eu em Queluz, se quiser passear nos jardins do palácio nacional não tendo direito a gratuitidade, nem aqui nem em todos os monumentos nacionais do meu concelho (Sintra) porque estes estão concessionados a uma empresa privada; Apenas recebo 150€ por ano de complemento especial de reforma que me escuso de comentar, pela mesma condição de antigo combatente mas anterior ao agora muito divulgado “cartão de antigo combatente”.

Por tudo o que acabo de expor informo que estou à disposição da Secretaria de Estado de Recursos Humanos e Antigos Combatentes para devolver as insígnias em meu poder, não abdicando das presentes e futuras regalias e apoios que venham a ser conferidos aos ditos “antigos combatentes” a título compensatório pela sua condição de vítimas da guerra colonial-fascista portuguesa.

Quanto à forma de devolver as insígnias poderá ser a que for julgada mais conveniente exceptuando a entrega a uma empresa privada, neste caso os CTT.

Com os meus cumprimentos


Jaime dos Santos Pereira"





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